
Na publicação "Tribuna do Direito" (ANO 14 - Nº 167, Março de 2007), saiu um artigo com o seguinte título: "Advogados não sabem negociar". Essa afirmação, pela leitura subseqüente do texto, remete à pesquisa do consultor Renato Hirata. Em termos jornalísticos parece ser um bom título, mas na realidade pode tornar-se uma generalização rígida demais. Também participei da entrevista, como vocês verão através da leitura do artigo, logo abaixo, por isso gostaria de esclarecer que não sou favorável a super-generalizações. Antes de me formar em Psicologia, eu já era advogada há algum tempo e, creio, mesmo, que muitos cursos de Direito se voltam mais para o enfoque adversarial, sem ênfase na negociação; mas, felizmente, cada vez mais profissionais do Direito vêm percebendo a importância de abordagens mais humanas na área jurídica e possuem competência, sim, para negociar. No próximo
post enviarei a íntegra da minha entrevista concedida por e-mail à repórter da Tribuna do Direito, Fernada Sal.
Leia, a seguir, o mencionado artigo:
Advogados não sabem negociar
Pesquisa indica que negociação é a melhor alternativa para solução de conflitos, mas os profissionais da Advocacia não têm competência
FERNANDA SAL
Poucos advogados têm competência para promover conciliação e mediação de interesses. A afirmação é do consultor Renato Hirata, sócio da Hirata Consultores & Associados e professor de Negociação Estratégica e Gerenciamento de Conflitos e Comportamento Organizacional do Ibmec-SP, que realizou uma pesquisa entre advogados brasileiros e descobriu que eles preocupam-se somente com a defesa e a decisão judicial e não tentam uma negociação entre as partes.
Para outra especialista na área, Lisiane Lindenmeyer Kalil, assessora em conflitos individuais e interpessoais, grande parte dos profissionais de Direito não possui características de negociador, como flexibilidade, valorização de relações interpessoais e sensibilidade quanto ao efeito das decisões para a parte oposta. Segundo ela, existe uma carência na formação acadêmica dos advogados para lidar com os conflitos fora do âmbito judicial. "As faculdades de Direito diplomam profissionais com enfoque 'adversarial', acusatório, rígido e, como conseqüência, inflexíveis", diz. Cita os estudos da advogada e terapeuta norte-americana Susan Daicoff, que sugere abordagens acadêmicas em mediação com uso de terapia e prevenção de conflitos visando o bem-estar dos envolvidos e reconhecendo a importância dos interesses. "Os cursos jurídicos brasileiros mal mencionam temas sobre negociação, mediação, conciliação e outras formas de resolução de problemas. Além disso, muitas vezes ignoram a importância de matérias como Psicologia, Antropologia, Sociologia", explica Lisiane ao mencionar que o ensino precisa ser repensado, "já que as faculdades têm papel crucial na formação de futuros negociadores e mediadores com uma visão menos hostil do conflito".
A especialista enfatiza que para uma boa negociação é imprescindível o enfoque preventivo, evitando-se danos a longo prazo. "O negociador não pode buscar apenas o que parece ser vantajoso no presente, mas visualizar as conseqüências futuras", informa ponderando que um acordo talvez não seja atrativo inicialmente, porém precisa ser sensato e embasado nos interesses das duas partes. O advogado, de acordo com Lisiane, tem de questionar "o custo econômico e emocional para o cliente caso não se consiga um acordo e seja preciso uma ação em juízo". Para ela, essa abordagem é relevante, principalmente quando envolve partes que têm relacionamentos contínuos, como ex-marido e ex-esposa, sindicatos dos empregados e sindicatos dos empregadores, vizinhos, bancos, etc.
Para Lisiane, o ditado "a palavra é prata, o silêncio é ouro" é válido nas negociações. Ela esclarece que os advogados têm de ser objetivos, tendo em mente que não se trata de debate, nem de julgamento. Segundo a especialista, o negociador deve identificar os interesses comuns que possam facilitar o acordo. "Mas os advogados precisam ouvir e compreender o ponto de vista da parte oposta", comenta destacando que devem ser evitados ataques pessoais e ameaças.
De acordo com a pesquisa de Renato Hirata, a cautela é necessária para não criar um ambiente de conflito. Hirata menciona que um estilo "harmonizador" seria o ideal para conciliar e mediar interesses. Segundo ele, o excesso de defesa causa atrito entre os advogados gerando pouca flexibilidade na soluções dos impasses.
Hirata diz que o profissional da Advocacia não gosta de assumir riscos e esquece de verificar as oportunidades que existem nos problemas. "A negociação é a melhor alternativa, porque atende as partes e pode solucionar o problema mais rápido do que o Judiciário", garante.
O consultor ressalta que quando os advogados "abrirem" os problemas para a outra parte, será mais fácil chegar a um consenso. Explica que a maioria dos litígios envolve emoção e que não adianta tratar o problema com um sistema racional. "O advogado não precisa ser terapeuta, mas precisa entender os problemas das partes, porque o acordo tem um foco emocional", explica. Concordando, Lisiane Kalil afirma ser conveniente que o profissional tenha noções sobre os aspectos psicológicos do conflito. "Conhecer técnicas de comunicação verbal e não-verbal é imprescindível", diz acrescentando que se uma negociação "emperra" e todos os recursos para um entendimento entre as partes se esgotam, a saída é levar o conflito para os tribunais. "Mas cabe ao advogado tentar levar o caso a um árbitro ou um mediador antes do litígio judicial", conclui.